Enquanto o sentimento de "tudo farinha do mesmo saco" sempre correu como um lençol freático sob a fundação do engajamento político brasileiro, é fato que o cinismo do brasileiro em relação à política do país ficou mais nítido nos últimos três anos. O motivo foi a entrada de cabeça, coração, corpo e alma na Era Digital.
Foi através da internet que os protestos recentes se tornaram um retrato nítido da noção reformulada que o Brasil tomou da própria estafa. Claro, em outros tempos, houve protestos tão grandes quanto os atuais. Muitos deles, por motivos ainda mais gritantes. Mas neste século 21, de repente, não estávamos mais sozinhos diante de nossos computadores. Não resumíamos mais as discussões acaloradas a mesas de bares, salas de aula e onde mais quer que fosse.
A natureza generalizada dos protestos pode e deve ser entendida como algo positivo em sua essência. Contudo, existe uma outra faceta colocada em relevo com a erupção de instatisfação pela qual passamos: o desespero. O sentimento de perdição abjeta que toma conta de quem se acomete do fato de que não há bons exemplos. A frustração de quem decide fazer uma reclamação ao síndico do prédio apenas para descobrir que não apenas não há síndico; como a fundação do prédio está completamente corroída.
A identificação interpessoal genuína e tangível que permeou a vida do brasileiro pré-internet se perdeu com a estratificação individualista que baseia o ambiente online. Contudo, foi reencontrada por meio da constatação de que, alfim e ao cabo, estamos perdidos. Não conseguimos ter identificação com nada ao nosso redor. Então pra que diabos sediar uma Copa do Mundo? Que diferença fará votar daqui um ano e meio?Não gostamos nem um pouco dessa constatação.
Não é que não haja boas ideias. Continuamos admirando a iniciativa da Lei Ficha Limpa. Mas ao mesmo tempo que é louvável, acabou por explicitar a profundidade do problema que enfrentamos. Desnudou por completo o contraste entre a consciência de que mudar é necessário e a completa ausência de uma direção pela qual começar. Permanecemos vulneráveis a tudo que se pareça minimamente com uma solução. Suscetíveis a nos distrairmos com tudo que se pareça minimamente com um culpado.
Ter consciência da situação não a resolve, mas é o melhor que podemos ter no momento.
Nenhum comentário
Postar um comentário